RESUMEN
INTRODUÇÃO E/OU FUNDAMENTO: A suplementação de vitamina D em indivíduos sem déficit aumentou significativamente nos últimos anos. Nos Estados Unidos a taxa de prescrição aumentou 30% ao longo de 10 anos. Contribuem para o fenômeno movimentos de opinião sustentando propriedades terapêuticas não comprovadas e a percepção geral de segurança e inocuidade. MÉTODOS: Relatamos um caso de intoxicação grave por vitamina D secundária a suplementação inadequada, inicialmente diagnosticada pela constatação de picos hipertensivos em paciente previamente normotensa. RESULTADOS: Paciente M.C.N., do sexo feminino, 60 anos, com história pregressa de fibromialgia, osteoartrite e depressão, mantinha acompanhamento com reumatologista e uso regular de trazodona, pregabalina e duloxetina. Após dosagem em consulta de rotina (vitamina D = 39ng/mL), recebeu prescrição de suplementação oral de colecalciferol (5000 UI/dia) por tempo indeterminado. Três semanas depois, a paciente, previamente normotensa, constatou picos hipertensivos e evoluiu com prurido generalizado, dor abdominal, náuseas e vômitos. Investigação inicial revelou hipercalcemia (cálcio total corrigido 13mg/ dL), injúria renal aguda (creatinina 2,3mg/dL) e hipertensão arterial (HA) confirmada em Monitorização Ambulatorial da Pressão Arterial (MAPA) de 24 horas. A tomografia de abdome não evidenciou alterações significativas e os sintomas digestivos foram atribuídos ao quadro metabólico. A dosagem de vitamina D confirmou a hipótese de intoxicação iatrogênica e Hipervitaminose D (vitamina D = incalculável). Após internação hospitalar, hidratação parenteral, suspensão da vitamina D e medidas para hipercalcemia, a paciente apresentou melhora progressiva da função renal e remissão dos sintomas. No entanto, mesmo após a resolução do quadro, a HA persiste até o momento, sendo necessárias para seu controle duas classes de anti-hipertensivos. CONCLUSÕES: Quase 500 anos atrás, o médico suíço Paracelso escreveu que "a diferença entre remédio e veneno está na dose". A incidência de intoxicação por vitamina D vem aumentando globalmente, seja por erro de manipulação, erro de prescrição ou uso suplementar em altas doses. Doses acima de 4000 UI/dia em períodos prolongados ou 10000 UI/ dia em períodos mais curtos foram associadas a elevação suprafisiológica do nível sérico (>150 ng/ml). O grau de intoxicação observado no caso apresentado parece desproporcional ao nível de suplementação e não podemos excluir erro de manipulação ou de uso. A associação entre Hipervitaminose D e HA é mediada tanto pela hipercalcemia como pela injuria renal. No entanto, neste caso a HA se manteve após resolução dos gatilhos iniciais, sugerindo que possam estar implicados outros mecanismos ainda não esclarecidos.